quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Abraçando a solidão


reflexão para adultos ativos





Por Marise Jalowitzki

Solidão pode ser sentida a qualquer momento, em qualquer lugar, só que nesta época do ano, muitas pessoas costumam sentir mais forte o aperto.

Como diz Alceu Valença:
"A solidão é fera,
a solidão devora,
é amiga das horas
prima-irmã do tempo
e faz nossos relógios caminharem lentos
marcando o descompasso do meu coração."

Assim como sentem solidão as crianças em abrigos, também os idosos em asilos e todas as pessoas que não se sentem amadas, compreendidas, acolhidas, ainda que estejam sob o mesmo teto. 

Lembro de um senhor frágil, que morava com sua família (já partiu há anos) que dizia:

"- Sabe o que é estar rodeado de todos os filhos, a mulher estar em casa, todos eles conversarem entre si, e tu ali, sozinho, como se tu não existisse?"

Ele se sentia muito só, os parentes o isolaram mesmo. Foi um caso bem triste, pois foi somente quando envelheceu que a família  o desprezou, o afastou do convívio, como se apenas lembrança já fosse. Troçavam dele, humilhavam com palavras e risos, ou, então, faziam de conta que ele não estava ali.

Quando uma situação assim se instala é MUITO difícil de contornar, de dizer algo no sentido de ajudar a pessoa a sair deste estado. No caso deste senhor, ele estava velho e doente, não conseguia mais nem andar direito. Enclausurado, a depressão o estava dominando. Quando tentei conversar com a família, a resposta foi muito agressiva e, entre outras considerações, escutei:

"Ah, então ele está se queixando pra ti? Melhor que não venhas mais aqui!"

Chocada, respondi brevemente com frases suaves, pois senti que aquele senhor, após a minha partida, poderia estar recebendo agressões, além dos maus tratos que já recebia. 

Há circunstâncias em que bem pouco, ou nada, é possível fazer. Ainda assim, procurei a Delegacia do Idoso, no centro, e relatei o que presenciara. A responsável me disse que nada poderia acontecer, pois não havia um B.O. (Boletim de Ocorrências) denunciando e provando possíveis agressões, não havia nenhum vizinho que testemunhasse ter assistido ou ouvido algum mau trato.

Ainda fui mais uma vez lá, cheia de presentes, tanto para este senhor, como para os familiares dele.   Eles receberam, mas a atitude era belicosa.

Felizmente, duas semanas após, fui notificada que ele hava sofrido um AVC e estava em coma. Ainda fui no hospital visitá-lo, ele queria sair dali... Como? A família dele é que era responsável. Seu estado, desolador... já não conseguia falar, nem escrever, por isso batia com a mão na parede... Dois dias depois teve morte cerebral e sua jornada terrestre acabou. Por que coloquei "Felizmente" no início deste parágrafo? Desculpem-me os que pensam diferente, mas, quando o cenário é tão desolador, sem perspectivas de melhoria, considero uma dádiva morrer de uma morte rápida. Imagina se o AVC fosse daqueles que deixa imobilizado em uma cadeira de rodas, tendo de ser alimentado por terceiros ou por sonda, tendo de receber banho diário por aqueles próprios que motivaram o atual quadro?

Realmente, amor, empatia, solidariedade, cuidados, apreço são coisas que existem apenas em alguns lares. Noutros, as pessoas acabam tendo uma atitude hostil sobre aquele ser enfraquecido, que precisa de cuidados especiais.

Por isso tantos idosos são encaminhados para casas de repouso, ou asilos mantidos pelo Estado e lá são esquecidos. Todos adultos têm pressa, mil afazeres e compromissos e "não sobra tempo" para cuidar de quem um dia cuidou deles...

Existem até projetos de lei de alguns parlamentares no sentido de multar os parentes que abandonam seus idosos, obrigando-os (caso queiram se livrar da multa) a visitar o parente... Será que resolve? 





Houve um período em que eu tinha uma amiga que abriu uma casa de repouso e, assim, eu visitava-a com alguma frequência. Esta amiga depois acabou fechando a casa de repouso, por praticamente adoecer com as coisas que se apresentaram lá. "Eu não tinha consciência desta realidade" - disse-me ela - "os familiares trazem os idosos pra cá quando já estão muito, muito avariados, ou física, ou mentalmente, ou ambos, e fica bem difícil de tratar. É extenuante por demais e praticamente todos eles fazem uso de psicotrópicos. E o pior: muitos parentes sequer aparecem para uma visita, seja no tempo que for!"...

Nesta casa, acabei mantendo alguns contatos com pessoas internas ali. Uma senhora, em particular, alta, magra, aparência de quem detinha muitos saberes, inclusive cognitivos, estava sempre sentada na varanda, olhar distante. Ela era plenamente lúcida. Em uma de nossas curtas conversas, elogiei-a por sua aparência e lucidez, por ainda estar tão bem também em relação à mobilidade (caminhava sem ajuda)... ela olhou ainda mais longe e disse: "Os que eu queria que estivessem comigo, não me quiseram em sua casa. De que adianta viver assim? Só pra dizer que está viva?"

Senti uma pena enorme dela, ainda tentei dizer umas palavras de alento, mas achei mais honesto dar-lhe um abraço.

(Se você chegou até aqui, reflita sobre a SUA capacidade de dar alento a quem está se sentindo sozinho! E faça algo a favor desta pessoa! Custa pouco e vale tanto!)


Mais sobre o tema:


Idoso - Monetarização do Idoso 



Por Marise Jalowitzki
https://suicidionao-sempretemquemseimporta.blogspot.com/2019/12/monetarizacao-do-idoso-natal-presenca.html











Quem muito aposta em pessoas que pouco conhece, 
pode se decepcionar e, acumuladas frustração 
e decepção, surge a raiva...



04.dezembro.2019













Natal é momento de avaliação e redirecionamentos,
de abraços e gratidão



07.dezembro.2011










Natal - Rua 25 de Março, em São Paulo
- Pessoas se acotovelam na ânsia de
comprar presentes




Por Marise Jalowitzki e Miguel Arcanjo

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